Seis séculos de muita arte
1466-1530
A representação de banqueiros, financeiros, cambistas e cobradores de impostos tornou-se um tema corrente na Flandres ao longo do século XVI, período de grandes transformações económicas na Europa, o que explica a existência de várias cópias e variantes desta composição. A obra, atribuída ao pintor flamengo Quentin Metsys, é idêntica, com pequenas variantes, à pintura considerada atualmente um original de Metsys que se encontra na Liechenstein Collection (Viena), com o título “The Tax Collectors”.
O cobrador de impostos, representado com óculos, regista informações supostamente contabilísticas num livro. O texto está escrito em francês. A análise da inscrição revela que não se trata de contas, nem de informações económicas (o que é o caso na maior parte das outras versões), mas sim de uma frase do Antigo Testamento, do livro Eclesiastes, alusiva à avareza, retirada de uma versão quinhentista de uma bíblia francesa (L’Ecclesiaste, 5-8 [L'avaricieux n'est jamais rempli d'argent. N’ai point souci des richesses injustes, car elles ne te profiteront rien au jour de la visitation]). Na última linha, uma frase do evangelho de São Lucas (12:15-31) ‘soyez donc sans avarice’ (guardai-vos de qualquer avareza). Esta pintura é a única, entre as várias versões que existem, que tem como inscrição uma referência bíblica, mensagem que alerta para a inutilidade da avareza na efemeridade da vida humana.
As vestes com gola e punhos de pele, o imponente turbante encarnado com uma joia de pedras preciosas e pérolas, idêntica à que está em cima da mesa, o anel no dedo indicador, indicam o elevado estatuto. Em cima da mesa, no canto à direita, em primeiro plano, a joia de rubi e pérolas pousada num invólucro de tecido ou de pele, a safira oval pousada num papel dourado, provenientes da Ásia e da América do Sul, evocam a importância da cidade de Antuérpia como plataforma de transação internacional de pedras preciosas provenientes de diversas partes do mundo. A personagem ao lado do cobrador, faz uma expressão agressiva, de crítica, e com o dedo aponta para o livro. Em cima da mesa estão várias moedas de ouro e de prata do século XVI. Henri II de França, em ouro e em prata, François Ier, em prata, e em destaque uma moeda de ouro com os reis católicos, Isabel e Fernando de Aragão, cunhada em Sevilha entre 1497 e 1504. Na parte superior da composição, uma prateleira com vários objetos, uma vela apagada, utensílio do quotidiano e alusão à efemeridade da vida e dos bens terrenos, uma tesoura pendurada num gancho, e por cima uma caixa com um selo de papel onde se lê ‘Ceulen’, referência à cidade de Colónia.
Esta obra, não assinada, tem sido alvo de polémica na atribuição, propondo-se a autoria de Quentin Metsys (1466-1530) ou de Marinus Van Reymerswaele (1490-1546), ambos pintores de Antuérpia. Na investigação desenvolvida no âmbito do estudo da Coleção de Pintura do novobanco, percebeu-se que esta pintura é certamente proveniente da Coleção Cailleux, dispersa no pós-guerra. Nesta coleção estava atribuída a Quentin Metsys.
|Óleo sobre madeira, 89x72cm
|COIMBRA, Museu Nacional Machado de Castro